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Small Church

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O Comentário Espontâneo chegou à televisão

O novo formato de comentário televisivo teve ontem a sua primeira emissão. 

A ideia, contra-intuitiva para muitos, de que o achismo dos habituais comentadores poderia ter ainda mais uma evolução, foi desenvolvida pelo markeeter Aníbal Soares, da empresa de comunicação Tocanalma.

Eram 21.30 quando a equipa de televisão chegou ao café Snack-Bar O Sonho da Raquel, na Buraca. 

Não demorando mais do que um minuto para que se juntassem algumas mesas, foi pedido a quatro pessoas para comentarem uma notícia de cada um de três tópicos: futebol, eleições e costumes. 

O único critério de seleção foi o de cada um dos participantes já ter bebido uma quantidade mínima de álcool, valor que não foi especificado na emissão.

Durante cerca de meia-hora, a conversa de café reclamou o seu papel de veia principal do sistema circulatório da noção de cidadania portuguesa.

Expressões como "Tou-te a dizer, Tó", "Tás mas é maluco" ou "Vais-me dizer que o gajo não sabia?" pontuaram as intervenções. 

Para satisfação do produção, a percentagem de share do programa ultrapassou a das emissões de comentário tradicionais. 

Segundo Aníbal Soares as pessoas estarão cansadas de ver comentadores pretensamente isentos, e que estão completamente fora da realidade, a debitar ideias de partidos que os colocam nas televisões.

A Associação Regional de Comentadores de Lisboa e Vale do Tejo já reagiu a este novo formato com uma nota de imprensa em que equipara a situação à de auxiliares de enfermagem passarem a dar consultas de especialidade, num tom irónico que não terá sido bem recebido pelas redes sociais, onde se pôde confirmar o grande sucesso da iniciativa.

Com nova emissão prevista para hoje no Café Mão Largas, em Mem-Martins, a partir das 21 horas, corre à boca pequena nos meandros partidários que se estará já a arregimentar militantes para estarem presentes por mera casualidade.

 

A chuva, a igreja e a família

O céu está escuro, de acordo com a chuva forte que cai. O portão do armazém está um pouco aberto e é aí que estou, fumando. 

Estar triste, de magoado, sem por isso sentir ressentimento, é uma marca da fé com que fui agraciado.

Mais uma vez, os que me chamam irmão, põem-me de lado por fumar. Desta vez, numa comunidade pequena de uma dezena de pessoas. 

É impossível não me lembrar de outras ocasiões em que a igreja me deixou este sentimento de exclusão por esse e por outros motivos. Amigos e família disseram Não és suficientemente exemplar para nos representar.

Aí está a igreja, a organização, como um fim em si mesmo. Não compreendo porque é que é assim.

O Jimmy Hendrix  começa agora na pequena coluna que anima o trabalho no armazém. A chuva é um rumor de sobressalto no telhado metálico do edifício. 

As coisas são como são. Continuarei a frequentar a mesma igreja. A comunidade continuará a tratar-me por irmão, apesar do paradoxo de não quererem que os represente perante o mundo. 

Lembro-me, agora com um pouco de alivio de diversão, as refeições em família em que todos eram convidados a dar graças menos eu. Anos e anos assim, porque, no fundo, eu não os representava junto de Deus. 

Reparo no modo como Jimmy canta a mesma melodia que a guitarra e apago o cigarro.

Pergunto-me se algum dos cristãos exemplares aos olhos da igreja, algum dos meus familiares exemplares aos olhos uns dos outros, saberá como é duro o sentir-se excluído e o real perigo que isso pode significar. 

Volto para dentro, para o armazém, mas não volto ao mesmo lugar onde já estive com esta tipo de mágoa. Já não há raiva nem reação. Apenas amor. 

 

A Raspadinha Eleitoral

Poderá o problema da abstenção ter os dias contados?

A Comissão Nacional de Eleições e a Santa Casa da Misericórdia assinaram ontem um acordo tendo em vista as próximas eleições legislativas.

Assim, para cada voto entregue na urna, passará a ser oferecido por um funcionário da SCM uma de quatro raspadinhas à escolha. Estas edições limitadas só estarão disponíveis no dia 10 de março e pretendem atrair pessoas que não costumem votar. 

Com nome tão sugestivos como apelativos, cada jogo será direcionado para um grupo demográfico especifico. 

A Tesouros no Parlamento atribuirá os habituais prémios em dinheiro e propõe-se ser destinada aos jogadores habituais.

A República a Bombar, planeada para seduzir o eleitorado mais jovem, atribui assinaturas Premium do Spotify e Youtube, assim como bilhetes de três dias para o NOS Alive.

A Hollywod Star oferece a possibilidade de se ganharem acessos a serviços de streaming à escolha entre Netflix, Amazon Prime, Disney +, Apple TV, HBO Max e Hulu, tendo sido pensada para atrair eleitoras entre os 25 e os 50 anos de idade.

Por fim, conta-se que a Vitória Esmagadora  apele maioritariamente a eleitores masculinos entre os 21 e 60 anos de idade e tem a especificidade de oferecer lugares de época nos estádios dos chamados Três Grandes

Ainda de salientar que todas as raspadinhas terão a garantia de prémio. Este consistirá em mais uma raspadinha, além daquela a que todos os cidadãos terão direito, nas próximas eleições europeias.

Numa nota enviada às redações, a CNE explica que caso esta iniciativa corra bem, existem já contactos exploratórios com diversas marcas habitualmente presentes em centros comerciais, dando exemplos da H&M, Kiabi, Pull & Bear, IKEA, Worten e Fnac, para que o âmbito de prémios possa vir a ser alargado a tempo do sufrágio para o Parlamento Europeu.

 

 

A Saúde Mental das Sondagens

A já conhecida disfuncionalidade das sondagens teve, na madrugada desta segunda-feira, o seu episódio mais grave.

A sondagem para a RTP e Público, de 30 de janeiro, desapareceu da Universidade Católica logo depois de terem sido reveladas as primeiras projeções dos resultados eleitorais deste domingo. Após vários telefonemas de cidadãos alertando para uma sondagem a correr seminua no tabuleiro da ponte 25 de Abril, as autoridades conseguiram localizá-la junto ao Cristo Rei, já de madrugada.

"Estava nitidamente alterada", disse um dos agentes policiais que primeiro chegou ao local, acrescentando "Gritava percentagem de abstenção de forma incoerente e havia rabiscado os pés de Cristo com projeções para a distribuição de indecisos com base em eleições da época do Estado Novo."     

Após algumas horas de negociação, a sondagem concordaria em entregar às autoridades o número de contactos com cidadãos maiores de 18 anos, com telefone fixo e residentes em Portugal, com os quais ameaçava por termo à vida. Entregar-se-ia, de seguida, de livre vontade após receber garantias de que não haveria votos em branco nas próximas legislativas.

Já no Hospital Amadora-Sintra, foi recebida por médicos especialistas em Urgência Estatística, tendo sido internada na novíssima ala de Sondagitopatia, onde ficou no mesmo quarto que a já famosa sondagem para a eleições para a Câmara de Lisboa, que nunca recuperou da quebra mental que a vitória de Carlos Moedas lhe terá causado.

O dia que havia de chegar e já cá está

O Chega, um partido com ainda nem 5 anos de existência, surgiu hoje, numa sondagem, pela primeira vez com 20%

Esta tarde, nos CTT da Venda do Pinheiro, presenciei um discurso vivaço, racista e securitário de uma senhora. A simplicidade de raciocínio e fraca elasticidade mental que ela apresentava fizeram-me pensar que ela poderia fazer parte desse eleitorado permeável à retórica do partido de extrema-direita.

Pensei, portanto, o que penso sempre que penso nas pessoas que votam no Chega: considerei aquela senhora, que lamentava a existência de mulheres brancas que namoram, ou vivem, com homens negros e que considerava, também, que havia um problema gravíssimo de segurança na vila, como somente alguém que está a ser enganada. Na verdade, refletindo, percebo agora que pessoas como ela não encontram entre os partidos nenhum que se preocupe com aquilo que consideram ser as suas maiores preocupações.

Quando é que os partidos nacionais passaram a descartar a tentativa de representar os cidadãos? Quando é que o chamado Centro  passou a optar por apostar nos reformados e funcionários públicos, deixando de saber como pensam os restantes eleitores? Não é como se o BE, a IL, o L ou o PAN pareçam mais capazes de mais alguma coisa do que falar para dentro da sua própria bolha. Na verdade, todos os partidos, com exceção do Chega, parecem estar bloqueados e não conseguem entrar, devido à sua ideologia e tiques urbanitas, em contacto com grande parte da populaçãoÉ uma questão de representação.

Pelo que se tem visto até agora, a performance do Chega é o exato oposto da CDU. Enquanto esta última surge sempre sobrevalorizado nas sondagens em relação aos efetivos resultados eleitorais, o Chega é o partido mais subvalorizado nesse aspeto. 

Quanto valerá hoje, na realidade, o partido de Ventura? Poderá ser já a segunda ou, quem sabe, a primeira força política nacional?

 

 

        

A Violência Performativa nos Jogos Olímpicos

O Comité Olímpico Internacional acrescentou mais um aos quarenta e seis desportos que fazem parte das Olimpíadas.

A nova disciplina, a Violência Performativa, terá inicialmente três competições em Paris, esperando-se que nos Jogos Olímpicos de 2028 haja um acréscimo significativo de outras modalidades que, entretanto, e certamente, surgirão até lá.

O Lançamento de Tinta a Obras de Arte Não-Contemporâneas será disputada com a variante Com e Sem Colagem de Corpo a Obra.

O Interromper Tráfego com o Rabo no Alcatrão será disputada em modo individual e por equipas em Autoestrada, Rua Citadina e Portão de Refinaria.

Por fim, o Palavras de Ordem contra o Capitalismo terá as variantes Anti-Israel, Anti-Fascismo, Anti-Imigração e Apocalipse Climático. Para esta última, espera-se com bastante antecipação a performance da ex-campeã mundial júnior em todos os escalões, Greta Thunberg.

Em Paris não haverá representantes portugueses, uma vez que a Climaximo terá falhado a obtenção dos mínimos  na sua última tentativa na 2ª Circular. 

Uma grave greve

O impacto desta greve por tempo indeterminado não podia ser maior. 

Falta um mês e pouco para as eleições e a paragem dos serviços prestados pela Esperança veio trazer um definitivo carimbo de tragédia ao nosso país.

O ridículo tomou conta da praça e há hoje a certeza de que iremos ter um Primeiro-Ministro tão fraco como só houve um outro, José Sócrates.

Se Santos é uma nulidade absoluta com provas falhadas nos mais diversos aspetos que interessam, Montenegro demonstrou a semana passada, ao não retirar desde logo a confiança política a Albuquerque, que, como líder, se confirma o que se suspeitava e que é demasiado mau para que a ele se possa confiar um voto que seja.

Se são sempre boas, de resto, estas clarificações em relação à má qualidade de alguém que pretende gerir o dinheiro de 10 milhões de portugueses, esta greve da Esperança afeta, sobretudo, todo o restante plantel de pretendentes a Primeiro-Ministro.

De facto, este ano, todos decidiram seguir o tradicional exemplo Socialista e prometer dinheiro. Se um diz Mil, o outro diz Mil e cem. O próximo diz então Mil e duzentos e por aí em diante. Não é que as insanidades Bloquistas e Comunistas neste aspeto não sejam conhecidas, ou previsíveis as mãos largas e indigentes do Chega, mas a IL e o Livre seguirem o mesmo caminho não deixa de ser  triste. 

A dificuldade em saber em quem votar não tem, este ano, tanto a ver com escolher o mal menor, como é hábito, mas mais com saber-se objetivamente que se irá votar, enfim, em idiotas.

Resta-nos que a Esperança termine esta greve, de resto perfeitamente legítima e compreensível, antes das eleições e nos venha a trazer aquela sensação agradável de auto-ilusão de que não habitamos já o Abismo e de que poderá haver alguém que traga reformas, poder de compra, saúde e justiça ao nosso país. 

 

A Marcha da Crise na Habituação

Decorreu neste domingo, em Lisboa, uma marcha contra o que se diz ser um ataque sem comparação ao Habitual.

Despoletada pelas recentes notícias de investigações a casos de corrupção, diversos setores da Administração Pública decidiram hoje manifestar-se, criticando a instabilidade que o aparente fim do habitual fechar de olhos da justiça à corrupção irá trazer ao setor.

Para Teresa Reis, porta-voz do movimento, passará a ser muito difícil o funcionário público de nível médio ou alto conseguir saber exatamente em que circunstâncias será seguro agir de um modo corrupto. Após referir que o habitual tem de ser preservado, Reis, de um modo incisivo, respondeu com dois exemplos à pergunta sobre o que queria dizer com habitual.

A vivenda com piscina de um funcionário do departamento urbanístico de uma Câmara...acha que foi com o salário municipal que a conseguiu construir ou terão sido anos e anos de corrupção e dinheiro por debaixo da mesa? É que é preciso trabalhar muito para ser-se um bom corrompido!  Mas, olhe, dou-lhe outro. A contrapartida por um ajuste direto, pode ser um qualquer em qualquer lado, implica um cuidado em disfarçar o rasto do dinheiro que se recebe em contrapartida que não é brincadeira!  Agora, para que tudo isto possa acontecer, é necessário que todos nós, como portugueses, estejamos habituados e saibamos, num acordo de cariz pragmático, que a corrupção não pode deixar de ser habitual. 

 

Finalmente a nova Estrada para a Salvação

Após décadas de discussão, o primeiro troço da nova Estrada para a Salvação começou ontem a ser construído.

Pensada para facilitar o conforto e rapidez do trajeto, este passará a ser efetuado em linha reta e terá a largura de 3 campos de futebol para minimizar acidentes e contratempos.

Para atenuar o cansaço e tédio, foram concessionados parques temáticos, hotéis, spas, jardins e restaurantes a partir de 4 estrelas Michelin para quem pretender fazer pausas. Um pequeno aeródromo ajudará quem quiser abreviar a jornada.

O já pouco usado, antigo e sinuoso caminho tradicional, que tantas críticas vinha sofrendo desde as primeiras décadas do século XX, irá continuar disponível para entusiastas do trekking cristão com os preços de acesso substancialmente mais caros (uma forma de encorajar a utilização do novo equipamento) sendo indispensável o tradicional Certificado de Nascido-de-Novo. Passarão estar afixados anúncios na famosa Porta Estreita avisando para o desconforto da viagem, das exigências do auto-sacrifício, das dificuldades da dependência da oração e da improbabilidade de amar o próximo como a si mesmo. Existirão saídas diretas para a nova estrada de 4 em 4 quilómetros, com a oferta de vouchers para utilização de vários dos equipamentos concessionados. 

Os encantadores de rotundas

Sendo habitual que as Câmaras Municipais contratem equipas de profissionais para realizar feitiços e rezas nos centros das rotundas para penalizar condutores que sigam pela faixa exterior quando só pretendem sair pelo menos duas saídas depois, a tradicional bruxaria nacional e parafernália Católica Romana tem vindo a ser substituída por outro tipo de intervenções de cariz sobrenatural como macumba, magia negra, voodu, rituais de origem asiática e objetos benzidos com água do Rio Jordão de igrejas neo-pentecostais brasileiras. 

A Associação Nacional de Encantadores de Rotundas expôs no inicio de janeiro, em comunicado, aquilo que entende ser uma dramática e brutal substituição que tem vindo a colocar grande pressão sobre dezenas de empresas tradicionais familiares, cuja dependência financeira do encantamento de rotundas é total. 

A mais recente polémica estalou no sábado na Rotunda da Marinha Grande, a mais conceituada da cidade e cuja concessão partilhada foi alargada pela Câmara, no final do ano passado, a um grupo de mágicos indianos. Os resultados habituais da bruxaria nacional, que rondam os cinquenta ou sessenta por cento diários de condutores em infração, terá sido no terceiro dia em que a empresa Mumbai Charms Express operou, reduzido para uns espantosos trinta e cinco por cento. 

Alguns vereadores de esquerda saudaram o sucesso da Mumbai  como exemplo de que o multicultarismo não é só possível, como desejável. Da parte da direita, o sentido do discurso foi contrário, tendo mesmo existido referências aos perigos para a sociedade de tipo de tecnologias de bruxaria não-nacionais, uma vez que dez pessoas tiveram problemas cardíacos enquanto rodeavam a rotunda e cerca de sessenta reportaram ouvir vozes incompreensíveis e assustadoras dentro da sua cabeças. Acusações entre vereadores de racismo, colonialismo, xenofobia, pactos com demónios e participações escondidas em negócios de restaurantes de Kebab levaram a uma eventual troca de empurrões e maus-olhados que só terminou com a intervenção das forças de segurança presentes no local.

 

 

Reações ao Silêncio de Deus

O movimento de Cristãos Indignados Com o Ausência de Revelação irá levar a cabo uma ação ao longo desta semana a favor do que dizem ser uma necessidade de revisão da política divina quanto à Sua revelação à Humanidade. Para estes ativistas é inadmissível que tantas pessoas vivam vidas inteiras sem se converter e que Deus, como soberano do Reino dos Céus, tem o dever de se revelar a cada um de um modo claro e acessível.

Nascido em Carcavelos, numa pequena igreja evangélica batista, o CICAR pretende usar diversas formas de pressão sobre Deus para que o trabalho de evangelização deixe de estar no centro das preocupações das igrejas.

"É muito difícil e não temos condições", disse-nos um jovem pastor que não quis ser identificado. "Na sociedade europeia ocidental temos de trabalhar vinte vezes mais do que em qualquer outra parte do mundo para conseguir conversões e estas tornaram-se tão raras que é muito frustrante. É injusto". 

Alicerçado na ideia de que os que entraram no Reino de Deus têm direito a ser ouvidos na organização do mesmo, será levada a cabo, como forma de protesto, uma ação de greve à oração. "Talvez assim o Senhor perceba que as coisas não podem continuar como estão", disse-nos um outro ativista. "Com o silêncio de tanta gente, Deus terá de reconsiderar aquilo que consideramos ser uma teimosia anacrónica." E à questão de quais serão as próximas formas de luta, se não existir uma resposta favorável, acrescentou "Não acredito que tal vá acontecer, mas de seguida não estão excluídas a paragem por tempo indeterminado do Louvor ou uma greve de zelo ao estudo bíblico".

 

   

O Direito Ficcional Incondicional em Congresso

Após as primeiras experiências com o Rendimento Básico Incondicional, começam a surgir vozes a defender o Direito Ficcional Incondicional.

A gratuitidade de acesso a qualquer livro, sala de cinema e plataformas de streaming irá ser discutida no primeiro congresso sobre o tema que irá decorrer a partir de sábado em Paris. 

Com forte inspiração no trabalho científico seminal da investigadora Lourdes Mastragnat, que sugere a dependência da ficção como a verdadeira marca civilizacional a partir do século XX, cresce, nos departamentos de Sociologia, Economia e Antropologia das universidades europeias, a ideia de que a ficção (de qualidade) deve ser considerado um direito básico do ser humano.

Segundo os números publicados pelo mais recente estudo do CES, cada cidadão português necessitará de cerca de 2 horas e meia diárias de ficção para que não sofra de carência ficcional, doença recém reconhecida pela OMS, e que é responsável por vários tipo de distúrbios a nível psicológico. O número de diagnósticos de CF tem crescido um pouco por todo o mundo.

"Desde pequenos que somos educados pela ficção", diz Mastragnat. "Desde os desenhos animados até a séries da Netflix, passando por telenovelas e séries juvenis, e isto só no que à televisão diz respeito, vivemos grande parte dos nossos dias ao longo de toda a vida num mundo inventado". Com fortes criticas à Desigualdade Ficcional que o capitalismo criou, que, segundo a investigadora, faz com que os ricos possam ler mais e assistir a séries de maior qualidade, o que causa uma diferença de qualidade de vida que penaliza quem não têm rendimentos suficientes para pagar, Mastragnat irá ser a principal oradora no Congresso.

O fim do Largo da Ressurreição

 

Quando visitámos o Largo da Ressurreição este encontrava-se vazio. O facto de estar fechado ao trânsito marca o local com um silêncio profundo. Com exceção de alguns pombos aqui e ali, a nossa única companhia foi um solitário varredor da Câmara. Este justificou o seu espanto ao ver-nos por nunca já ninguém ali passar, concentrando-se as pessoas em grande número nas ruas adjacentes. Aí sim, há sempre coisas a acontecer. Já ninguém dá qualquer valor à Ressurreição, disse antes de voltar ao trabalho.

De facto, as imediações do Largo estão hoje ocupadas por lojas de teólogos, escritores especialistas na verdadeira vida cristã, por cerca de centenas de sedes de várias igrejas, algumas dependências de organizações ligadas à caridade, dezenas de locais de atuação de artistas religiosos e uma série de pequenas bancas móveis de apóstolos e profetas das mais variadas nacionalidades. 

Erigida em tempos em que a Ressurreição era fundamental para a identidade cristã, foi a partir desse local que a metrópole em que hoje vivemos se desenvolveu. O nascimento de outros interesses, outras modas e sociedades encarregar-se-ia de tornar o Largo obsoleto, razão pela qual irá a votos na Assembleia Municipal, na próxima quinta-feira, o tipo da já decidida (por unanimidade) requalificação do espaço que, para já, contará com a retirada da famosa escultura de Gallego com o pormenor da mão de Tomé a tocar a chaga na mão de Cristo e com o levantamento das antiquíssimas lajes concêntricas com os nomes dos apóstolos e mártires dos dois primeiros séculos.   

Na votação desta semana estarão a concorrer trinta propostas que interpretam os únicos requisitos para o novo espaço: ser inclusivo, interdisciplinar, não dogmático e, sobretudo, não ser passível de causar desconforto. Segundo a última sondagem, a proposta que mais apoio parece ter é a que pretende substituir a temática de Ressurreição pela do Perdão, propondo, além do novo nome, a instalação de vários equipamentos pensados especificamente para que ninguém se possa sentir intimidado por algum tipo de culpa.

 

 

 

A Comissão das Igrejas Abandonadas

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                                                        Fotografia Francis Meslet

A Comissão das Igrejas Abandonadas (CIA) foi criada em 1976 com o objetivo de inventariar locais de culto rejeitados por cristãos. 

A CIA original era constituída por três membros: Álvaro Spalletino, Guy de Forges e Rebecca Cohen. Até à morte de de Forges, em 2014, os Amanuenses do Vazio Divino, como passariam a ser conhecidos depois de uma reportagem da revista Rolling Stone, em 1985, registariam cerca de 215 capelas, igrejas ou conventos. Com a entrada de Pablo Casares, historiador de Granada, para o lugar do filósofo belga, a quantidade de locais sagrados registados por ano tem vindo, gradualmente, a diminuir, sendo a sua soma no ano passado de somente três novos casos identificados.

A idade avançada de Spalletino e Cohen traz-lhes uma cada vez maior indisponibilidade para deslocações, referiu uma fonte próxima, o que terá deixado sob responsabilidade de Casares o grosso do trabalho de coletar nova informação. Como único agnóstico do grupo, o espanhol tem sido acusado de ter uma agenda ideológica por detrás daquela que alguns setores da sociedade apelidam de fraca e inadmissível produção.

Por vezes entro num local religioso e sinto uma tristeza que não consigo explicar, disse Casares recentemente em entrevista, cuja polémica subsequente originaria a famosa carta aberta Deus Não é Bem Vindo Aqui, subscrita por mais de 300 intelectuais e artistas. 

Aquelas paredes erigidas pela esperança e pela fé como que choram silenciosamente o desaparecimento de pessoas por quem eram responsáveis. Lamentam, dir-se-ia, já não fazerem ecoar cânticos e preces, refletir as chamas das velas acendidas por reverência ou sublimar a segurança dos silêncios de crentes perante a magnitude do poder de um deus, escreveria Casares num direito a resposta a um duro editorial do maior jornal nacional ainda na sequência da entrevista, acrescentando ainda o espanhol nesse texto As madeiras dos bancos encostadas num monte, ou a ausência deles, empresta a esses locais um vazio quase trágico de espera. Onde estão os pés e os joelhos para que os suportemos?, parecem dizer as lajes. Onde estão os olhos para receberem a nossa luz?, sussurram as janelas que não estão entaipadas. E o altar geme Já não tenho nada para oferecer ao que é mais alto do que o Homem.   

Reportando diretamente ao Instituto da Regressão Religiosa, e com responsabilidade de garantir que os trezentos locais de culto catalogados continuem a não ser usados para fins religiosos, estima-se que a CIA tenha cerca de 300 locais sob supervisão. 

 

 

Moral da História

Antes da guerra Israel-Hamas, não compreendia como o Holocausto podia ter acontecido. Isso mudou, já para não falar no que tenho visto escrito nas redes sociais, ao ver as noticias sobre a reação das pessoas no mundo ocidental a toda a situação em Gaza e Israel.

O principal problema do ser humano continua, como sempre, a ser moral. Os comportamentos solitários ou gregários, quando baseados no não reconhecimento da humanidade do outro, irão sempre levar a tragédias, sejam estas cometidas pelo homem que mata a mulher por vingança, num embate entre claques antes de um jogo de futebol, num governo que permite que se estabeleçam colonatos em terra alheia ou numa manifestação em que se grita pela extinção de um povo.

 

Cardiologia

Quando se é novo, saímos do coração da mãe para o nosso próprio poder arriscar a construção.

Mais tarde, se correr bem, é-nos dada a oportunidade de voltarmos a esse coração casa.

No fim pode ser-nos dado o privilégio de velar por ele enquanto se vai transferindo, connosco ainda lá dentro, para um lugar misterioso. 

O vodu do Tranquilo

Por estes dias, respondem-me com "tranquilo" muitas vezes. Qual a razão desta obsessão e necessidade, que parece ter tomado conta de muitos portugueses, em assegurar ao outro a tranquilidade? O que é que se receia se não o disser? Será que uma pessoa que me responde com tranquilo quando lhe digo que vou entregar alguma coisa a determinada hora, por exemplo, tem receio que eu vá viver intranquilo até lá? Ou estará a dizer-me que é ela que não está nervosa e que está em paz com o que eu disse? Nunca percebi bem, confesso. Mas, lá está, tranquilo

Nas trocas de mensagem online, onde dizer as palavras que se quer dizer já não é suficiente, a comunicação regrediu uns 4000 mil anos ao ter de se passar a socorrer de pequenas figuras, como os egípcios faziam, para as completar. Aí está o polegar, o smile amarelo nas suas várias variantes, os arco-íris e o resto da turba.  Os símbolos representam as emoções, como se as palavras não fossem capazes de significado suficiente. Com a internet passou a existir uma necessidade, hoje já formal, de comunicar ao outro como nos sentimos ou o que achamos do que disse. Caso contrário, na sua falta, estamos a ser secos, sarcásticos ou irónicos. No fundo, geramos intranquilidade.

Existe o castelhano, é verdade, e poderá alguém dizer que terá vindo daí. Todavia, a mim não me parece. Antes, desconfio de que estará relacionado com os tempos que vivemos e com esta famosa moderna estrela comportamental da moda a que chamamos ansiedade. Talvez já não bastem as expressões como OK, ou está bem, ou combinado, e seja preciso ir mais longe e usar essa espécie de emoticon linguístico que é o tranquilo para assegurar o bem social mais precioso que será, por estes dias, a não emoção negativa.

O tranquilo não é só uma substituição zen do Está descansado ou Não te preocupes ou do Combinado. É também, e sobretudo, uma forma de superstição, de afastamento dessa aparência de mau-olhado que é o desconforto que nos toma quando surge a preocupação, a forma mais simples da ansiedade. Nada de emoções negativas, camarada! Eu sinalizo-te tranquilo e vamos esperar que esse vodu funcione. Vamos fingir que estou mesmo tranquilo. Se o dissermos muitas vezes, quem sabe?     

 

 

 

 

Normalização

Sobrevivi até aqui sem psicólogos, psiquiatras e sem fármacos. Não me permitirei deixar de fazer parte dessa exceção entre os adultos contemporâneos com menos de 60 anos. 

Cometi o erro de contar as pessoas à minha volta que já tiveram depressões, burnouts e afins, e as que precisaram de “ajuda” psicológica profissional ou especializada. São muitas, arrisco a maioria. É espantosa a normalização desta fragilidade, a criação desta cultura da doença mental. Dir-se-ia impossível a sobrevivência da humanidade até aos anos 90 do século passado, altura em que tudo isto começou.

 

 

 

 

Simplicidade

E, nesse percurso de rarefação da minha perceção de Deus, vou-me espantando com a simplicidade crescente do Caminho e da Boa Nova. Recuando ainda um pouco mais, chego a YHWH e às Suas únicas condições: a fé no que não é material e a obediência à moral proposta.

Manifesta-se pela primeira vez perante os meus olhos, nessa aproximação de YHWH a Moisés, a diferença entre uma fé cega e a praticada de olhos fechados enquanto se dá o passo por obediência.

Expira, nessa obediência, Jesus na cruz, cobrindo mais tarde a Humanidade na Ressurreição com o manto que o pai lhe confiou: a Boa Nova de que a Lei se resume a amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. O arrependimento é uma consequência imediata perante o corpo ressurreto e da mente que revê os seus amigos em choque e pede comida.

YHWH a Moisés. O Messias a nós. As mesmas palavras, o mesmo gesto de convite a uma vida terrestre plena, totalmente material e espiritual ao mesmo tempo. As mesmas palavras, insurgindo a oração no desespero dos dias, ecoando no mundo desde há milhares de anos como um ruído de fundo, como o vento, o mar ou palrar de um bebé.

Um ruído divino circulando eternamente pelo mundo, preparado para ser entendido como o sopro de Deus.

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