O riso alheio tem dois gumes
São, pelo menos, 15 anos mais novas do que eu. Durante a pausa da tarde estivemos a falar sobre youtubers. Quando nos separamos, oiço-os rir na escada como quem esteve a conter as gargalhadas durante o tempo que estiveram comigo. Fico a pensar que é de mim que se riem e sinto um desconforto agudo. Na verdade, não sei se é de mim que se riem, mas, como só oiço e não os vejo, faço a ligação óbvia. Imagino-me de imediato como o colega mais velho que não tem noção da idade que já tem e que os mais novos, por uma réstia de respeito, gozam às escondidas.
Sinto um tipo profundo de vergonha infantil e digo a mim mesmo que daí para a frente me vou calar de vez quando calhar estar com eles. Mas, enfim, pode ser ou pode não ser. O riso pode ter sido o resultado de um tropeção, ou assim, e descontraio. E acabo por analisar com curiosidade esta minha reação antiga, este pânico de fazer ‘figura’ perante os outros. Porque é que deveria ser assim tão importante a forma como pessoas de que não dependo me vêm ou aquilo que acham de mim? Afinal, conforme vou ficando mais velho, a Reputação, essa velha máquina humana de hierarquia, vai fazendo cada menos sentido, principalmente para quem, como eu, já não tem paciência para se sentir chateado ou triste com o que quer que seja.
Sorrio ao pensar como pode o riso alheio ter dois gumes e como o olhar, o ver alguém a rir-se, acaba por ser determinante.