Legado de Família
Para pessoas pouco abastadas, que não deixam dinheiro, casas ou barcos aos filhos, a sua herança aos seus pode muito bem ser melhor do que as já referidas. A minha mãe, hoje muito velhinha, o que me deixou foi na forma de "valores". O valor de Jesus Cristo, e de como a minha vida pode ser melhor e valiosa, para mim e para os outros. Honestidade, sinceridade, humildade, o valor dos outros e muitas, muitas outras pérolas, bem mais valiosas do que bens materiais. Para ser franco, estou aquém daquilo que ela representa. Mas sempre em progresso.
Mas deixou outras coisas. Além do Bolo Borrachão, uma delas, absolutamente simples, como só a minha mãe sabia fazer: pasteis de bacalhau. E outra igualmente simples e ainda mais óbvia: o meu irmão amar aqueles pasteis de bacalhau.
Isto faz-me recuar com a memória. Viver algumas boas recordações de infância. A minha idade dá-me este crédito, finalmente: dizer coisas nostálgicas sem parecer demasiado mal.
Em bom tempo pedi à minha mãe a receita. E é isso mesmo que me proponho doar à humanidade, visto este blog ser público. Sei que a minha mãe aprovaria. Aqui vai.
Ingredientes: Uma posta de bacalhau cozida; batata cozida do mesmo peso; um dente de alho; um ramo de salsa; dois ovos e não menos que isso.
Instruções: Desfiar, esmagar e moer bem o bacalhau com a batata, juntar a salsa e o alho bem picados, bem fininhos, e juntar os ovos bem mexidos. Fazer as formas finais usando duas colheres de sopa e carinho. Fritar em óleo. Et voilá!
Foi o que fiz, uma hora atrás para o meu jantar. Ficou bastante bom. Mas, há que dizê-lo com sinceridade, a mil quilómetros de distância daqueles que a minha mãe fazia.
Lembrei-me do meu irmão. Era o Zé Luis que eu queria que estivesse aqui comigo. Se ele estivesse havia de fazer também um arrozinho de tomate. Havíamos de comer os pasteis com arroz, tranquilamente, para fechar o último Domingo de calor do ano em grande estilo. Depois olhávamos um para o outro, com um sorriso amarelo e dizíamos em côro: "Naaaa. Não é o da mãe!"